sábado, 26 de setembro de 2009

We live in a Fairy Tale...


Era uma vez uma criança, um menino, que passava muito tempo na casa de sua avó. Descendente de ciganos, ela lhe contava muitas histórias sobre seus antepassados antes dele dormir. Convenientemente, eram histórias de terror que ele nunca levara a sério, pois a avó contava dando risadas.

Numa noite, a senhora abriu um livro muito velho e usado e contou a história dos Anjos de Khabash.
Tratava-se de doze anjos que gostavam de se divertir com crianças pequenas. Chamavam-nas durante o sono e as levavam para um reino encantado onde podiam comer, beber e brincar incansavelmente.
Os anjos eram altos e tinham olhos muito claros, quase totalmente brancos; suas asas eram longas e douradas, podendo voar até o Sol ou até a Lua.
Em especial, pegavam as crianças que dormiam mal, as que demoravam a cair no sono, porque dormiam até mais tarde.

O menino perguntou se todas as crianças gostavam de brincar com os anjos. Não, a avó respondeu.
Nem com todos os meninos os anjos eram amigáveis. Poderiam ser ariscos e brincar de machucá-las com suas asas.
E o que acontece a essas crianças, perguntou ele, meio assustado. A avó não respondeu. Apenas sorriu e beijou a testa do neto, abrindo a janela do quarto.
É melhor ficar quieto e dormir logo, disse, saindo do quarto.

Os minutos se arrastaram pesadamente, sem trazer o sono do garoto, que começou a ficar com medo. A casa da avó ficava no meio de várias árvores e um jardim grande, de modo que os sons da noite só cessavam quando eram substituídos pelos sons do dia. Logo o menino começou a estranhar o silêncio profundo que se instalou sobre a casa.
Não havia som algum, nem sequer a respiração da avó. Seus olhos se enceram de lágrimas e buscou a voz para chamar algum nome. Estava rouco e lhe faltava ar, seus pulmões doíam como os de um recém-nascido ao dar o primeiro suspiro.

O primeiro som o fez dar um leve arranco na cama e cobrir a cabeça. Era um som forte, vindo do ar. Respirava baixo e rápido, as lágrimas escorrendo livremente pelo rosto, agarrando-se firmemente às cobertas.

O segundo som era igual, porém mais forte. E veio de novo, e de novo. Seguidamente, até ficar desigual. Custou a reconhecer o barulho. Era assustador. Parecia que estava na praia, envolto de pombas voando a seu redor.
Bater de asas. Asas compridas.

Gemeu baixinho, chamando pela avó. Não houve resposta. O quarto ficava insuportavelmente quente, como se estivesse cheio. Era um cômodo pequeno.
Sentiu coisas baterem em sua cama, mas não ousou olhar por cima do cobertor; era como se várias pessoas estivessem se mexendo dentro do quarto, todas ao mesmo tempo.
O oxigênio lhe escapava, respirando um ar que lhe parecia sujo e demasiado quente, que entrava rasgando suas vias respiratórias.

Algo fez pressão em seu corpo. Começou pelos pés e foi subindo, como se algo deitasse sobre ele, membro por membro, e por fim ele estava todo debaixo de algo pesado, exceto por seu rosto.
O cobertor que lhe cobria a face começou a ser abaixado; seus olhos arregalados se fecharam com força.


No dia seguinte a avó abaixou o tecido, revelando o rosto do menino, sereno, como se estivesse muito longe.
Ele não abria os olhos, não abria.

Um comentário:

  1. Adorei, maaas o titulo ta com um minusculo erro: o certo seria we live, ao inves de we lives =B

    ResponderExcluir