terça-feira, 19 de outubro de 2010

A mulher dos cabelos de prata - o primeiro


Marcelo parou na frente do prédio, tirando um cigarro do bolso e acendendo, enquanto se escorava na parede. Já era o sexto da manhã, e ia sendo tragado rapidamente. Tinha tentado escolher sua melhor roupa casual, sem saber que impressão realmente queria causar, e acabou se decidindo por uma camiseta do Deep Purple e seus jeans habituais. Se sentia meio adolescente assim, de forma que suas mãos suadas passavam por seu cabelo com apreensão, que cheirava a xampu e neblina matinal.

Deus, ele estava apavorado, como queria voltar para seu apartamento.

Fazia um dia nublado. Nenhum raio de sol atravessava o cobertor de nuvens acima de sua cabeça, ao que Marcelo era muito agradecido, pois não seria cegado ao ver o sol se refletir nos cabelo loiros dela; Achava que desmaiaria se visse algo assim tão de perto.

Brincava com seu isqueiro azul na mão quando ela apareceu na esquina, sem aquela porta atrapalhando a visão. Mais bonita do que nunca, mais bonita que qualquer droga de mulher.

Quase que se passava como um filme: ela, como sempre, a atriz principal, que caminhava devagar sob os grandes holofotes que eram os olhos de seu admirador, pisando leve, cantando baixo e, pasme, sorrindo. Ele derretia com o desejo de pegá-la pela mão e levá-la a seu apartamento, onde não faria nada além de mostrar-lhe seus livros e discos e observá-la incansavelmente.

A mulher dos cabelos de prata alargou um pouco seu sorriso frio, olhando para Marcelo. Ele apenas observou os fios brilhantes que desciam trançados pelos seus ombros, seios e cintura. Sem nome, ela se vestia em tons pastéis que se misturavam com o cenário monocromático da rua, sem perder seu destaque.

Alguns segundos e ela já subia as escadas sem ruído (que eram feitas de mógno escuro que já se tornavam quase algo simbólico para Marcelo), e como sempre, ela ela não derrubou seu café da manhã ou tropeçou, e ele não conseguia imaginá-la fazendo isso.

Enquanto seu coração refazia os batimentos normais, o rapaz acendeu o sétimo cigarro matinal, fechando os olhos e sorrindo, esperando que a agonia de todos os dias o atacasse: por que não falo com ela?

Só conseguia pensar na mulher dos cabelos de prata e no café que o esperava lá em cima, enquanto uma música ecoava meio distante, falando sobre esses amores que não sobem as escadas e permanecem no anonimato. Marcelo achou tudo muito bonito e poético, mas estava ocupado demais concluindo que sua vizinha tinha cheiro de baunilha.

Um comentário: